Paulo César
" Saímos do carro e fomos para um morro do Rio Vermelho a meu pedido. Quando cheguei lá, abri a capota, fiquei de pé e tirei a roupa. Em seguida, mandei que ele tirrasse também a roupa, enquanto eu me requebrava, em pé no banco de trás. E aí, com uma lua descomunal iluminando a barra da baía de Todos os Santos, eu encarnei todas as deusas do amor, todas as diabas desabridas que povoam o universo, a Luxúria com suas traiçoeiras sombras coleantes e seus estandartes imorais, seu chamado à devassidão, à dissipação e à entrega a todos os gozos de todas os matizes até chegar à morte lasciva, eu era a Luxúria integral, baixada ali para reinar como um espírito imisericordioso e invencível, naquele morro assombrado e suas redondezas petrificadas. Eu fiz tudo com ele, tudo, a ponto de achar que ele desfaleceria. E nem perguntou nada, quando eu sentei em cima do pau dele e ele viu que eu já estava longe de ser virgem. Não perguntou, nem eu disse nada. Depois de tudo o que fizemos, saí do carro, vesti a roupa, ajeitei o cabelo e a maquilhagem, me compus com calma, voltei para o carro e, ao sentar, pedi com um sorriso recatado, quase pudico, que ele me levasse em casa. Fomos em silêncio e olhando para a frente, eu curtindo o vento no rosto e achando a paisagem muito mais bonita que de hábito. Quando chegamos, ele me quis me beijar, mas eu fiz que não com a cabeça e o empurrei levemente com o antebraço. E, com a cara mais impassível do mundo, tirei a aliança, botei na mão dele, disse que me esquecesse, acenei bye-bye e entrei, ele lá fora com a aliança na palma da mão estendida, o queixo certamente tocando a cintura."
Paulo César
A Casa dos Budas Ditosos - João Ubaldo Ribeiro
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